segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Voluntariado

Não vi o vídeo. E não quero ver, porque vou ficar mais revoltada do que já estou.
Gostava que isso fosse encarado como uma carta aberta para esta menina, a Mia ou lá como se chama.
Sou uma mãe que perdeu uma filha, felizmente não com cancro. Digo felizmente porque só de pensar na hipótese de que a minha filha pode ter sofrido dentro de mim, me põe em agonia. Digo felizmente porque eu não sei o que é ver morrer um filho, aos poucos. Digo felizmente porque eu não sei o que é um médico dizer que não há mais nada a fazer. Digo felizmente porque a palavra desistir não está no vocabulário de uma mãe.
Por duas vezes estive para ser voluntária no IPO. Da segunda vez desisti porque ainda me sentia muito abalada com a perda da minha filha, estava tudo muito recente.
Não quis ir porque achei que não tinha nada para dar, porque queria ser um apoio para aquelas mães e pais, e da maneira como estava não ia conseguir.
Quis a vida que me cruzasse com mães que perderam os seus filhos com cancro, e tenho aprendido tanto com elas!
A maior parte do que eu sinto é semelhante ao que elas sentem, mas, como disse acima, não sei o que é ver morrer um filho. A minha dor é grande, mas não consigo dimensionar a dor dessas mães...
A vontade de ser voluntária reapareceu, estou a encher-me, para que possa dar.
O que eu mais quero é que um dia uma mãe me confie o seu filho, para que ela possa descansar, espairecer ou somente chorar, mas longe dos seus pequenos guerreiros.
Esta menina devia ser instruída a não falar daquilo que não sabe. Numa entrevista qualquer ela disse que não queria ser mãe, por razões que para ela são válidas. Eu respeito. Mas uma pessoa que diz que não quer ser mãe não sabe o que é a SER mãe.
Não sabe da nossa entrega total aos nossos filhos. Não sabe que nós passávamos por todo o mal do mundo para que nada lhes atingisse. Não sabe do que somos capazes pela vida dos nossos filhos. Não sabe o que é, todos os dias, aceitar a morte deles, porque já estavam a sofrer demasiado e foi o melhor, dentro de todo o prognóstico ruim, que podia lhes ter acontecido.
Não sei quando o fornecimento de nutrientes e oxigénio começou a ser ineficaz para a Leonor. Sei quando ela morreu. Sei o que acontece quando o cérebro é privado de oxigénio, por pouco tempo que seja. Sei que se ela tivesse sobrevivido, talvez não fosse uma criança saudável. E isso não, eu não queria que a minha filha sofresse. Que tenha eu saudades de cortar a respiração dela, mas que mais nada de mal lhe toque.
Essa menina devia ser instruída a não falar do que não sabe...

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

A melhor Avó do mundo...

Ao escrever este texto, pergunto-me como é possível ao longo destes 24 anos ainda não o ter feito... Parece tão óbvio!

Desde que me lembro de ser gente, existias na minha vida. Sei que tu e a minha mãe tiveram um "início de relação" que não foi pacífico, mas que tudo acabou por se resolver a bem quando eu nasci.
Sei o quanto me amaste. E o digo não é por todas as prendas que me davas e por me fazeres todas as vontades... Aliás, acho que isso só contribuiu para que eu tivesse um filha da mãe de um egozinho inflado até ao céu!
O digo porque ainda hoje, 24 anos depois de teres partido, ainda sinto o amor que tinhas por mim. Ficou marcado em mim de tal maneira que ao lembrar-me de ti, um sorriso gigante me assoma ao rosto, porque eras, és, simplesmente, a melhor avó do mundo...
Tenho pena que tenhas partido tão cedo... Ainda tínhamos tanto para viver! Tenho pena também por não me ter despedido de ti... E acho que esse facto ajuda a sensação que muitas vezes tenho em relação a ti; às vezes parece impossível teres partido... Como podes ter partido se continuas tão viva dentro da minha memória e das minhas lembranças? O mesmo se passa em relação à Nô... As duas partiram demasiado cedo. Deixaram-me sem perceber bem como se continua, como se ultrapassa duas perdas tão grandes... Por outro lado, se depois de morrermos existe mais alguma coisa do que aquilo que os meus sentidos alcançam, a minha Princesa é uma mimada pela bisavó, disso eu tenho certeza! ❤️
Tenho pena que os meus irmãos e o meu primo não te tenham conhecido... Eras amor em forma de pessoa. O teu abraço... Ainda hoje, se fechar os olhos, consigo sentir a tua pele de avó, o teu cheiro, aquele sinal que tinhas no rosto... Caramba, como é possível terem passado 24 anos?!?!
Espero que o meu Francisco ame tanto as avós dele como eu amo-te, que elas sejam o aconchego que sempre foste para mim...

Obrigada pelos 9 anos maravilhosos contigo... Queria mais, muito mais...

Amo-te tanto... Tenho tantas saudades...

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Quando a nossa cama é tomada de assalto

Já não lembro começou.
Sei que sempre gostei de adormecê-lo nos meus braços, foi sempre o "nosso" momento.
Um dia, dei-me conta de que ele ficava ali a noite toda. O tempo passou, e ele continuou na minha cama.
Habituei-me. Ao som da respiração. Ao calor do corpo. Ao acordar com ele aconchegado a mim.
Sei que ele já deveria estar no seu próprio quarto... Só que quem não consegue deixá-lo ir sou eu.
E se ele tiver medo? E se tiver frio? E se chorar e eu não ouvir? Tem estado sempre comigo e com o pai, é tão pequeno, porque tenho que pô-lo sozinho?
Ele está a crescer tão rápido... Vai chegar a altura em que vai querer o seu próprio espaço.
E eu estou disposta a dá-lo, também porque nessa altura, pelo menos aos meus olhos, já não vai ser nem tão pequeno, nem tão indefeso.
Ontem me apercebi que mais alguém chegou para dormir connosco... E quer saber?! Que se lixe! A cama é grande, eu e o pai não nos importamos... Cabe sempre mais um 💙